Bandeira de Moçambique |
terça-feira, 6 de dezembro de 2016
Quando o desenvolvimento ameaça as línguas locais
As Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) definem
desenvolvimento humano como aquele que situa as pessoas no centro do
desenvolvimento, promovendo a realização do seu potencial, o aumento de suas realizações,
desfrutando da liberdade de viver a vida que elas desejam.
Aproveitando-se deste pensamento, coloco-me a questionar
o futuro de algumas etnias, valores éticos, traços culturais e porque não a
origem de certos povos. Fundamento esta ideia na ideia de que estamos a passos
largos para a extinção de muitas línguas locais (ou se quiserem chamar
dialectos, comumente dito).
As perspectivas de desenvolvimento, seja ele económico ou
educacional já demonstrou que algumas raízes poderão se colocar em causa, á
medida que a língua tida como de união (portuguesa) se vai sobrepondo sobre as línguas
locais.
Quando falo do perigo da extinção das línguas locais,
quero aqui problematizar, não so a língua portuguesa, mas também o
“preconceito” que se tem de que quem não fala o português é analfabeto. Afinal
o que seria analfabeto? Quem deveria ser chamado analfabeto?
Nos recorremos, neste sentido, ao ocidentalismo para
definir o nosso modus vivendi. Ora,
chama-se analfabeto o idoso que bem sabe falar Xistua e escreve? Se assim for,
precisamos desgrudarmo-nos da concepção, não só capitalista, mas também
ocidentalista que faz-nos ignorar a nossa própria cultura/identidade em
detrimento das outras. Mas claro que não nego, nesta perspectiva, a ideia de
que o português seria a tal língua que “uniria” as províncias.
O importante, na minha perspectiva, na minha perspectiva,
é que se façam pesquisas no sentido de materializar as línguas, torna-las
“escrevíveis” para que elas se salvem da extinção. Digo isto porque quanto mais
as pessoas sobem de nível académico, mais vão se afastando das línguas locais.
Ora, se um jovem vai a Inglaterra volta priorizando o inglês em detrimento do
Changana, por exemplo.
O ponto é que a educação para o respeito das línguas deve
começar da família, pois esta é a responsável pelo esquecimento das línguas
locais em detrimento das de “socialização” ou que garanta o sucesso na vida.
Prevejo um novo mundo no qual se vai falar uma língua
mundial. Se me perguntassem qual, provavelmente diria inglês, já que o alemão
mostra-se a caminho de extinção e o mandarim ainda precisa fortificar-se no
panorama internacional, mesmo o fazendo aos poucos. Aliás, com a colonização da
Inglaterra, as colonias só deram seguimento a fortificação da presença do inglês
nos povos.
Que impacto da extinção das línguas locais? Mais
ocidentalização dos povos e perda de originalidade cultural. Mas há um porem.
Nota-se que as comunidades fechadas, não são afectadas por esta perspectiva,
daí que me colocaria a dizer que a globalização ou o desenvolvimento são,
nalgum momento, um atentado as étnicas, valores e identidades de um povo.
O risco que temos é o esquecimento total das línguas
locais, porque diferentemente do latim que era falado e escrito, temos ainda
línguas locais que precisam ser pesquisadas por forma que, ainda eu sejam
extintas, continuem sendo línguas faladas, assim como o faz o latim.
Nesta esteira de pensamento, poderia, porventura, chamar
a atenção aos linguistas, no sentido de melhor aprofundarem sobre a origem,
interpretação/escrita das línguas, no sentido, não só de perceber a sua génese,
mas também perceber o seu impacto num todo processo de construção social.
Claro que não precisamos olhar para o português como o “monstro”
porque existe entre as nossas comunidades os preconceitos/ guerras entre
realidades (tribalismo), seja ele linguístico, ou ainda no processo de
socialização.
O meu ponto é: precisamos perceber que impacto teria a
extinção de uma língua local, num cenário em que pretendemos valorizar as
nossas raízes. Poderia dizer que não há probabilidades exactas de extinção das
línguas locais porque muitos adultos usam-se delas para se comunicar. Mas já
percebemos que as novas gerações são/serão feitas de jovens que “fogem” das
línguas locais. Ademais, com o desenvolvimento vamos criando mecanismos para
que se ignorem as nossas línguas “originárias”. Que fazer?
Precisaríamos, provavelmente, de políticas direccionadas
a exaltação de tais línguas, e porque não inserir na educação línguas locais,
como vimos alguns exemplos (ainda que não mensuráveis) nalguns pontos do país.
Vejo um país que será num futuro breve devastado pelos
esquecimento de suas línguas locais, para isso, precisamos da atenção
suficiente para remodelar as nossas bases culturais e educacionais, no sentido
de preserva-las. É claro que não nos podemos deixar a margem do
desenvolvimento. Precisamos, claro, compreender as outras línguas. O ponto é:
como não deixar que as nossas sejam expurgadas por outras.
Sérgio
dos Céus Nelson
Sobre o autor do blog
Sérgio dos Céus Nelson
Communication Officer at Lúrio University Journalist. Freelancer. Activist of Human Rights. Photographer
Communication and information specialist. Journalist. Writer. Screenwriter. Researcher. Motivator. Volunteer.
Founder of the Association of Environmental and Human Rights Journalists - AJADH and the Literary Association of Arts and Culture of Mozambique (ALARCUMO).
Contact: (+258) 829683204 or 846065018/879877312
Skype: Sérgio dos Céus Nelson
Journalist with Honorable Mention in the International Prize for Human Rights Journalism, by the Association of Public Defenders of the State of Rio Grande do Sul (ADPERGS) - Brazil.