quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

LIDERAR NÃO É UMA TAREFA FÁCIL

A vida em sociedade é uma espécie de desafio a todo aquele que nela se encontra. Por ser-se cidadão, existem diversos desafios e regras que cada um (de nós) precisa seguir para melhor conviver em sociedade. A esta mesma perspectiva, todo aquele que impõe leis e restrições, a um indivíduo ou colectividade, também lhe recaem responsabilidades, que estão estritamente ligadas a necessidade de salvaguardar o bem-estar social.
Quando penso em liderança, penso em como sociedade pode estar a banalizar um termo tão fácil de se pronunciar, mas também difícil à medida que carrega consigo certas responsabilidades e dever em relação ao comportamento que cada um deve demonstrar socialmente.
Não podemos apenas partir do pressuposto de que é líder aquele que ocupa um cargo de maior relevância e muito menos aquele que demasiadamente discursa socialmente. Há um dever moral, num líder, que jamais se pode/deveria olvidar: o comprometimento e entrega em relação a causas de uma certa colectividade e/ou da sociedade no geral. Liderança adquire-se e é um merecimento, de certa forma, pois é preciso saber deixar um legado e permitir que os seus seguidores, por mais que não estejas por perto, possam executar as actividades com maior perfeição.
Na Teoria da Atribuição da Liderança percebemos a liderança como algo que se “dá” ou que se é merecido. Um caso mais claro é o de Winston Churchill que conseguiu liderar o Reino Unido aquando da segunda guerra mundial, mas este veio a perder certa “credibilidade” ao perder as eleições. 
Com a banalização do conceito liderança, abrimos mazelas para que num futuro breve este conceito, precise ser reformulado ou esteja atrofiado, porque até lá não saberemos quem realmente representa as preocupações de uma colectividade.
Quando digo que “Liderar não é tarefa fácil”, pretendo dizer que não é fácil representar uma sociedade agastada, uma sociedade esfomeada, analfabeta, indecisa, desnutrida, amedrontada, e cada vez mais crítica, assim como não é fácil (e jamais deveria se considerar fácil) governar um povo definido por diversidades étnicas, culturais e raciais. Vivemos numa altura em que o mundo (com o advento da globalização, por exemplo) a sociedade mundial despertou e está cada vez mais a pedir por liberdades de expressão, direitos individuais/fundamentais, respeito pelos direitos humanos, legalização do aborto, respeito pelas “minorias” sexuais, etc. Esses todos factores nos deveriam fazer reflectir e repensar na forma como implementamos e desenhamos as políticas que regem as sociedades, pois já não é altura de nos basearmos em políticas belicistas que não se comprometem a escutar a opinião social para tomar decisões que sejam para o bem social…do povo.
Há necessidade de ser-se sério para saber liderar, para revolver os problemas que afligem as massas. Não podemos ainda nos cingir em discursos apenas matemáticos (que de certa forma excluem os não letrados), esquecendo que vivemos numa sociedade feita de emoções, com gente que almeja estar inserida em cada discurso socialmente “proliferado”. É contraditório querer representar uma colectividade que não se respeita, assim como não se pode lutar contra o crime enquanto houver fácil acesso e vendas de armas. 
Uma coisa que se aprende com falsas lideranças é que na falta de uma boa liderança, as pessoas, o povo sempre vai acreditar em qualquer um que for a abrir a boca. É um jogo de “vingança”, de certa forma. O que pretendo assim dizer, é que o processo de liderar significa dar prioridade, prestar atenção e se propor a resolver os diversos problemas/aflições da sociedade na qual se vive.
Quando paro e me recordo da Declaração da ONU, de 1945, sobre a necessidade de autodeterminação dos povos, me questiono se será que a sociedade africana percebeu que precisa aprender a decidir o seu rumo, por si só, ou se entendeu como autodeterminação a liberdade de deixar que o exterior nos venha governar. Jamais haverá uma soberania absoluta num país que é política, cultural, social e economicamente endividado. Há nesta perspectiva aquilo que Raymond Aron diz no seu livro (Paz e guerra entre as nações) sobre a dispensabilidade das nações.
Viver em contextos onde as guerras ideológicas, raciais e físicas são mais fortes, apenas nos provam que a humanidade poderá não ter conseguido ainda alienar-se do seu maior provável defeito: o gosto pela violência. Sempre defendi que vencer uma guerra é evitar que ela aconteça, permitindo desta forma que o diálogo (nosso maior meta a alcançar) seja o melhor caminho a resolver as nossas disparidades.
Mas mais do que apenas acreditar numa liderança efectivamente responsável, é preciso que se olhe para o liderado, o seu papel e o seu envolvimento directo nos processos de tomada de decisão que definem o rumo dos países. Viver numa sociedade que não sabe exercer os seus direitos nos desafia a compreender as motivações sociais e os factores que interferem nisso.
O que pretendo aqui defender é que quando um indivíduo vota por vingança e não por lucidez/moral, percebe-se claramente que o mais grave na democracia não é quando se perde eleições, mas sim quando a sociedade esquece a razão/lógica do voto e o seu papel na formulação/reformulação do país no qual se insere. A isto me questiono se será democracia o direito de votar, não importando o decurso do processo de votação (contagem e divulgação dos resultados). Se assim for, como então definimos a democracia africana, alienando-se da perspectiva ocidental? Que tipo de cidadão as nossas sociedades merecem e quem deve ser considerado cidadão em democracia?
Apesar das perguntas, que aqui faço, acredito fielmente que as sociedades são resultados do tipo de cidadão que tem. Não faz sentido termos uma sociedade criminosa enquanto temos cidadãos mentalmente sãos e moralmente educados. Assim como o elitismo político, ao distanciar-se das camadas mais baixas, dificilmente sabe identificar os reais problemas que o povo enfrenta, o cidadão também torna-se cúmplice do sistema quando “ilogicamente” decide o rumo de um país em detrimento de emoções e não da razão.
É inquestionável que o cidadão torna-se o maior corrupto quando aceita ser liderado (melhor dizer chefiado) por alguém sem escrúpulos. Não é a toa que vivemos numa era em que os valores morais vão perdendo valor em detrimento da “criminalização” da convivência social.
Várias vezes ouvimos as perguntas: “porquê África não pode criar seus próprios caminhos”, “porquê chamar doutores e engenheiros de fora se temos internamente os nossos que foram bem formados? Isto deriva-se de diversos factores, ao meu entender. Principalmente pelo facto de vivermos em sociedades com politicas rudimentares e de agressão, onde políticos servem como “cocaínas” que promovem mais dispersão social, divergências, comungado/aliado ao facto da imoralidade do cidadão que vota a cor partidária e jamais a capacidade que um determinado indivíduo tem de dar um rumo melhor para a sociedade.
É tempo dos partidos fechados, com perspectivas estalinistas, abrirem-se para aprender com os outros. Assim como penso que a paz é responsabilidade de todos, e que jamais existirá uma paz efectiva com dependência externa. Acredito ser preciso repensar-se na "nominalização" de certos partidos políticos, que continuam com perspectivas belicistas e, por causa da sua génese, como se fossem detentores do estado (olhando o estado como propriedade).
Vivemos em cenários em que é tão visível a legitimação da violência. Tal legitimação tem culpa pluralizada (cidadão - governo). Para romper-se com a ideia do “Yessimo”, que faz o indivíduo aceitar até o inaceitável, aceitar a dor mesmo sabendo que existe a felicidade, é preciso que se invista, não só na despartidarização da mentalidade social, como é também preciso a moralização da mesma, para perceber-se que o voto não se pode exercer por vingança, mas sim com o intuito de mudar, para o melhor, um determinado país.
Sou apologista de que a maior impotência que um indivíduo pode ter não é a sexual, mas sim a intelectual/mental. Olhar para esta perspectiva, me aliando a Geoffey Blainey (Uma breve História do Mundo) ao olhar o papel de cada indivíduo como importante para a formação de um estado, procuro questionar sobre o papel dos académicos e intelectuais numa sociedade. Digo isto porque vivemos numa era em que a intelectualidade usa-se como uma bíblia para oprimir o analfabeto/pobre.
Com esta crise dos PhD’s, que apenas esperam ouvir o que lhes agrada, certamente encontraremos, em parte, uma negação em ajudar a sociedade a melhor perceber os adventos/diversos factores que lhes apoquentam, e encontraremos uma sociedade na qual a ditadura intelectual servirá, não só como para alimentar os sistemas e regimes, assim como para a autoproclamação dos “estudados”.
Em Anthony Giddens (Sociologia), quando nos fala do crime ele nos fazer perceber que os estudos do crime (criminologia) ignoram a metade da população, por ser disciplina dominada pelo Homem. O mesmo acontece em lideranças. 
Talvez antes de continuar seja preciso dizer/explicar que a liderança e chefia são coisas bastantes diferentes. Todo mundo sabe. A liderança ela preconiza a ideia de que o indivíduo que lidera é seguido por confiança, basicamente, e o chefe é seguido porque a lei, as regras e o dever assim impõem. Essa é a melhor forma, para de forma sintética, diferenciar esses dois factores. Agora, a ideia da dominação falada por Giddens nos desafia a repensar as nossas sociedades, na forma como a representação política e social se comporta. É preciso que se repense no cidadão que precisamos para os próximos tempos. Falo de um cidadão mais activo, critico, participativo e acima de tudo “visionário”, aquele que melhor saberá definir o rumo da sociedade na qual se encontra.
Não são apenas países africanos que fracassam. A história nos mostra que todo mundo já fracassou alguma vez, por isso é preciso que África acorde e se reconstrua. Se formos para a historia vamos encontrar um Brasil que, nove semanas depois de aceitar a ajuda de 41 bilhões de dólares do FMI, viu-se obrigado a abandonar o regime de Cambio fixo em 1993, o que desvalorizou o Real face ao Dólar, em 40%, a desvalorização do rublo em 1998, o fracasso da operação resgate da Coreia do Sul pelo FMI, no inicio de Dezembro de 1997 – fase que mais abalou a economia mundial nos anos 90. Todo mundo deve aprender com os seus erros e com os dos outros, para melhor implementar políticas internas que salvaguardem os interesses locais.
Karl Polanyi, In “A Grande transformação da nação” (Um dos 150 melhores livros do século), se preocupa com o processo económico na civilização moderna. Ele olha para a economia como algo que exclui "maioridades"/os outros. Podemos usar esta analogia para questionar a falta, por exemplo, da prestação de contas por parte dos nossos estados, a etilização da política, elevadas e variadas regalias, enquanto a desnutrição crónica, por exemplo, sobe o número de óbitos. 
Um documento das Nações Unidas revelou que África perde anualmente cerca de 500 mil milhões de Dólares com Fluxos Financeiros Ilícitos (FFI). Pensar nesta revelação me faz lembrar de Kofi Annan que sempre defendia a ideia de que “Governar é o melhor caminho para erradicar a pobreza”. Pensar neste sentido é pensar pelo povo e para o povo. E mais do que tudo, acreditar que um país real não se constrói com promessas que são renovadas de quatro em quatro anos.
Os nossos chefes e/ou líderes precisam perceber que com o grande poder vem grandes responsabilidades. É preciso que se lute para implementar as boas leis existentes e rectificar ou revogar as que danificam o crescimento dos estados.
Existem vários problemas sociais que apenas serão resolvidos quando a política/governos e a sociedade se comprometerem a adoptar medidas responsáveis. Se formos a ver, por exemplo, as nossas forças armadas, que tem estado muito tempo “inoperantes”, já que não há uma previsão de eclosão de guerra no país (hipoteticamente), podemos nos questionar o porquê de não se usar a mesma para uma guerra humanitária. Sabemos que a medicina militar é uma medicina avançada. É preciso que ela seja usada nas comunidades mais rurais, fazer chegar ao cidadão mais pacato e usar as forças armadas para a mudança de mentalidades. 
Existe uma perspectiva do subdesenvolvimento que é prejudicial. O subdesenvolvimento traz consigo a ideia da economia das colónias para a metrópole e acima de tudo nos revela que é uma forma de desenvolvimento mal conduzido. Tal má gestão deriva da concentração de riquezas, fome, seca, baixo índice de desenvolvimento humano, desemprego, analfabetismo, etc. O que nós vemos, o caro acesso aos medicamentos/medicina, por exemplo, apenas nos desafia a ser um país melhor que sabe definir prioridades.
Davide Hume, In “A crítica da razão pura”, nos desafia a perceber os eventos do mundo para encontrar a verdade. Isso é o mesmo que dizer que é preciso entender a natureza humana: uma mulher leva nove meses para ter um filho. Não adianta colocar nove mulheres juntas e pressioná-las a ter um filho em um único mês. Cada passo que um verdadeiro líder deve dar tem que estar estritamente ligado a resolução e/ou melhoria dos problemas sociais. 
As dificuldades podem ser várias e adversas, mas como diz Lao Tzu “Uma jornada de mil quilómetros começa com um único passo”. Mas esse passo deve ser dado de forma sábia. Deve ser meta lutar contra o medo que os cidadãos têm do advogado e directamente com o facto de a defesa dos direitos fundamentas continuar cara para o cidadão. A lei se não for a servir para os interesses da colectividade jamais será “racional” (sei que há subjectividade neste pensamento), porque é na essência o que preconiza a criação de uma lei – é exactamente a ideia do Contrato Social do Rousseau, em parte.
É preciso que se aprenda a liderar, saber os valores de uma real liderança e os pressupostos que se inserem nessa grande responsabilidade que muitas vezes parece ser esquecida. Não podemos usar liderança como um “hobby”. Não podemos criar lideranças de dia para noite. Não podemos endeusar chefes para líderes. É preciso que as sociedades saibam escolher o tipo de indivíduo que os vai levar à meta que pretendem alcançar. É disto que a liderança funciona: a formação de uma equipe que interage, se respeita e valoriza os esforços que cada um exerce…para o bem comum.

Sérgio dos Céus Nelson

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Frente aos factos

Sobre o autor do blog

Sérgio dos Céus Nelson

Communication Officer at Lúrio University Journalist. Freelancer. Activist of Human Rights. Photographer

Communication and information specialist. Journalist. Writer. Screenwriter. Researcher. Motivator. Volunteer.

Founder of the Association of Environmental and Human Rights Journalists - AJADH and the Literary Association of Arts and Culture of Mozambique (ALARCUMO).

Contact: (+258) 829683204 or 846065018/879877312

Skype: Sérgio dos Céus Nelson

Journalist with Honorable Mention in the International Prize for Human Rights Journalism, by the Association of Public Defenders of the State of Rio Grande do Sul (ADPERGS) - Brazil.

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