quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

“Chico António é um pai cultural para mim”



Foto: Moulinho
Um jovem visionário, talentoso e acima de tudo com suas próprias convicções sobre o mundo da sétima arte. Sentados em duas cadeiras opostas, Moulinho, com aquele olhar viajante que fazia-se descrever profundamente a sua paixão sobre o cinema, convidou-nos numa viagem até ao encontro das suas ambições e dos planos que vem guardando na manga, tais planos que estão no seu desejo de um dia tornar-se um grande realizador e aperfeiçoar a sua escrita.
Com aquela vontade de sempre, de saber mais sobre o rumo da cultura moçambicana, o Frente aos Factos falou com Moulinho sobre as suas perspectivas de vida.

Frente aos Factos (FF): Quem é Lionel Moulinho?
LIONEL MOULINHO (LM): Moulinho é este jovem emergente no mercado moçambicano. Começo a retractar cinema a partir da vida de João Paulo em 1997. Foi nessa altura que fiz um convite a João Paulo e já tinha dotes de edição de imagem fazendo vídeo clipes, mas pegando uma obra concreta foi a partir de João Paulo nesse período de 1997.
FF: Há sempre dificuldades enfrentadas quando entra-se numa batalha. Quais foram as que te acompanharam desde que pensou em entrar neste mundo cinematográfico?
LM: As dificuldades foram imensas. Primeiro pelo facto de não acreditarem em ti faz com que certas ambições não se realizem. Muitas vezes quando lancei o filme “Ecos de Silencio” sobre o João Paulo as pessoas perguntavam quem era o tal Lionel Moulinho. Muitas vezes pensavam ou esperavam que fosse um tal Moulinho de mais de cinquenta anos, isto porque muitas vezes os realizadores no país são pessoas que partem de trinta anos para cima. Lionel é um cineasta que vem fazendo documentário sobre a vida de artistas nacionais.
FF: O facto de as pessoas não acreditarem em ti, muda a rota dos teus sonhos?
LM: De jeito nenhum porque o conhecimento não tem idade. Tenho muito orgulho de ter feito o meu primeiro filme com 28 anos, oque é de grande relevância. Importa referir que comecei a trabalhar com João Paulo quando tinha 24 anos. Tendo em mente que já tenho quatro filmes produzidos, posso dizer que o facto de as pessoas não acreditarem em mim não me enfraquece.
FF: Com quem já trabalhou durante este percurso da sua carreira?
LM: Alem de ter trabalhado com João Paulo, pude trabalhar com Noel Langa, Victor Sousa e recentemente fiz o meu ultimo filme “Trompete cometa Guitarra ou menino de ninguém” sobre Chico António, no qual conto toda sua história desde Magude ate aos dias actuais.
Como já se sabe, Chico António foi um menino de rua que perdeu o norte aos seis anos e tomou o comboio de Magude ate Maputo. De Maputo ele torna-se menino de rua ate aos 10 anos, altura em que foi submetido ao reformatório do Colégio da Missão José, e foi la onde ele aprendeu a música e tornou-se nesta referência que ele é hoje.
FF: Sei que tem um laço de amizade com Chico António. Que significado ele tem na sua vida?
LM: O significado da minha vida com Chico é imenso, isto porque ele próprio assume que é a continuidade de João Paulo, o que quer dizer que o meu trabalho com João Paulo não ficou terminado. Fora de ser um músico ou uma figura emblemática, entre mim e Chico há um laço de irmandade, amizade que temos e nos facilita partilhar segredos. Chico António é um pai cultural para mim.
FF: Será que o cinema tem vida em Moçambique?
LM: Atendendo que o cinema é a sétima arte, a arte que engloba tudo, desde a fotografia, imagem, voz, música significa que merece respeito. Acho que precisa-se de muita estima entre nós. Vejo que ainda não há orgulho em comprar um CD original dos artistas nacionais. Precisamos dar espaço ao que é nosso, sem descriminação.
No seu todo, acho que o cinema é uma maneira de ensinar rapidamente. Nota-se que em três dias que se lê um livro, em cinema pode-se aprender em um único dia. É o meio de comunicação e ensino muito rápido.
FF: Com que género cinematográfico mais se identifica?
LM: Eu amo fazer documentário, porque é aí onde está o meu desafio de colocar as imagens reais e dar uma proposta ficcional. O documentário é algo fixo, real e nele pode-se dar um outro ponto de vista. Não nego fazer vídeo clipes, filmes sobre ficção, mas o documentário é onde encontro o meu “EU” e o foco do meu trabalho.
FF: O que traz de novo no documentário sobre Chico António a nível dos planos de corte, personagens…? Em forma de sinopse o que nos pode avançar?
LM: O maior desafio deste documentário era mostrar como uma coisa passa para outra. Então, é por isso que quis mostrar como um menino de rua passou para um grande músico. Alias, queria mesmo mostrar como uma pessoa como Chico que não tem pai, mãe e irmãos é uma pessoa com família e com uma personalidade respeitada.
Faço este documentário porque penso que é uma história de coragem que Chico nos exemplifica e mostra que aqueles meninos de rua não podem terminar somente como meninos de rua. O que quero dizer é que há sim uma possibilidade daqueles meninos de rua tornarem-se personalidades e recuperarem sua identidade. Esta é a principal missão que tive ao realizar este documentário. Este não é um filme sobre um músico, apesar de falar da vida musical de Chico. Mas o que quero com o documentário é dar este exemplo de coragem e que a sua história não fosse somente uma história que ficasse no meu coração ou livro porque alguém leu. O que queria é que as pessoas se identificassem e reflectissem em todo desta história.
Com este documentário atingi o meu dever de memória, porque acho que todos têm um dever de guardar alguma memória em vida.
FF: A quanto tempo conhece Chico António?
LM: Conheço Chico logo após João Paulo, isso foi sensivelmente a seis anos e foi ele mesmo que veio ter comigo, por reconhecer o meu valor e o trabalho que fiz com João Paulo. Na altura eu só o conhecia em nome, mas foi mesmo em 2009 que houve uma aproximação e ele sugeriu que eu fizesse arquivos sobre ele.
FF: Que ambições guarda para um futuro próximo?
LM: Na minha profissão gostava de ser um realizador com uma estrutura bem montada para poder digerir o meu pensamento, o que acontece é que em Moçambique não há organização e acabo trabalhando, por exemplo, como um homem-orquestra em que vai fazendo vários papéis dentro do cinema.
Eu gostaria de fluir meu pensamento e experiencia na escrita e realização, apesar de amar a edição, mas amo as duas áreas que mencionei. Aminha ambição é também de promover o nome do país através do meu nome, dos meus filmes ao patamar mais alto e deixar marcado o nome e o cinema moçambicano.
FF: Nigéria, por exemplo, é um dos grandes destaques a nível do cinema africano. Fazendo uma comparação, o que acha que falta para que o cinema moçambicano concorra com outros tipos de cinemas sejam eles mundiais ou do continente africano?
LM: Acho que há falta de cultura nos nossos dirigentes. Se formos a prestar atenção, vamos perceber que nos temos um a tradição de cinema a muito tempo. Noutros países os dirigentes tem noção do que é trabalhar com a cultura e no nosso país os nossos dirigentes são por nomeação política, oque pode dificultar o trabalho. Um outro problema é que há falta da nova geração de cinema e não sei quantos cineastas existem com trinta anos para baixo.
Nem Zimbabwe ou Africa do Sul tem um arquivo de documentários mais extenso ou com muito material do que nós.
O documentário “Trompete cometa Guitarra ou menino de ninguém” tem como parceiros Pro Arte, SPI, Brithol Michcoma, TVM, Namaacha e conta com 77 minutos em formato HDV e tem legendas em Português, Inglês, Castelhano.
Na sua ficha técnica tem Lionel Moulinho no roteiro, câmara e edição, como assistente de produção conta com Begona Victoriano, Produção de secretariado: Graça Magaia, Esme Joaquim, Música: Chico António, produção de campo: Zeca Baila, Tonni, Arranjos e legenda: Chiquinho Martins, caricatura capa: Sérgio Zimba, foto contra capa: Sol de Carvalho, arte gráfica: Júlia Vilhena, produção/direcção: Lionel Moulinho, Assistência técnica: António Cabrita e produção: JP Studio.

Sérgio dos Céus Nelson

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Frente aos factos

Sobre o autor do blog

Sérgio dos Céus Nelson

Communication Officer at Lúrio University Journalist. Freelancer. Activist of Human Rights. Photographer

Communication and information specialist. Journalist. Writer. Screenwriter. Researcher. Motivator. Volunteer.

Founder of the Association of Environmental and Human Rights Journalists - AJADH and the Literary Association of Arts and Culture of Mozambique (ALARCUMO).

Contact: (+258) 829683204 or 846065018/879877312

Skype: Sérgio dos Céus Nelson

Journalist with Honorable Mention in the International Prize for Human Rights Journalism, by the Association of Public Defenders of the State of Rio Grande do Sul (ADPERGS) - Brazil.

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