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Foto: Moulinho |
Um
jovem visionário, talentoso e acima de tudo com suas próprias convicções sobre
o mundo da sétima arte. Sentados em duas cadeiras opostas, Moulinho, com aquele
olhar viajante que fazia-se descrever profundamente a sua paixão sobre o
cinema, convidou-nos numa viagem até ao encontro das suas ambições e dos planos
que vem guardando na manga, tais planos que estão no seu desejo de um dia
tornar-se um grande realizador e aperfeiçoar a sua escrita.
Com
aquela vontade de sempre, de saber mais sobre o rumo da cultura moçambicana, o Frente aos Factos falou com Moulinho sobre as suas perspectivas de vida.
Frente aos Factos (FF): Quem é Lionel Moulinho?
LIONEL MOULINHO (LM):
Moulinho é este jovem emergente no mercado moçambicano. Começo a retractar
cinema a partir da vida de João Paulo em 1997. Foi nessa altura que fiz um convite
a João Paulo e já tinha dotes de edição de imagem fazendo vídeo clipes, mas
pegando uma obra concreta foi a partir de João Paulo nesse período de 1997.
FF:
Há sempre dificuldades enfrentadas
quando entra-se numa batalha. Quais foram as que te acompanharam desde que
pensou em entrar neste mundo cinematográfico?
LM:
As dificuldades foram imensas. Primeiro pelo facto de não acreditarem em ti faz
com que certas ambições não se realizem. Muitas vezes quando lancei o filme
“Ecos de Silencio” sobre o João Paulo as pessoas perguntavam quem era o tal Lionel
Moulinho. Muitas vezes pensavam ou esperavam que fosse um tal Moulinho de mais
de cinquenta anos, isto porque muitas vezes os realizadores no país são pessoas
que partem de trinta anos para cima. Lionel é um cineasta que vem fazendo
documentário sobre a vida de artistas nacionais.
FF:
O facto de as pessoas não acreditarem em
ti, muda a rota dos teus sonhos?
LM:
De jeito nenhum porque o conhecimento não tem idade. Tenho muito orgulho de ter
feito o meu primeiro filme com 28 anos, oque é de grande relevância. Importa
referir que comecei a trabalhar com João Paulo quando tinha 24 anos. Tendo em
mente que já tenho quatro filmes produzidos, posso dizer que o facto de as
pessoas não acreditarem em mim não me enfraquece.
FF:
Com quem já trabalhou durante este
percurso da sua carreira?
LM:
Alem de ter trabalhado com João Paulo, pude trabalhar com Noel Langa, Victor
Sousa e recentemente fiz o meu ultimo filme “Trompete cometa Guitarra ou menino
de ninguém” sobre Chico António, no qual conto toda sua história desde Magude
ate aos dias actuais.
Como
já se sabe, Chico António foi um menino de rua que perdeu o norte aos seis anos
e tomou o comboio de Magude ate Maputo. De Maputo ele torna-se menino de rua
ate aos 10 anos, altura em que foi submetido ao reformatório do Colégio da Missão
José, e foi la onde ele aprendeu a música e tornou-se nesta referência que ele
é hoje.
FF: Sei que tem um laço de amizade
com Chico António. Que significado ele tem na sua vida?
LM:
O significado da minha vida com Chico é imenso, isto porque ele próprio assume
que é a continuidade de João Paulo, o que quer dizer que o meu trabalho com João
Paulo não ficou terminado. Fora de ser um músico ou uma figura emblemática,
entre mim e Chico há um laço de irmandade, amizade que temos e nos facilita
partilhar segredos. Chico António é um pai cultural para mim.
FF:
Será que o cinema tem vida em Moçambique?
LM:
Atendendo que o cinema é a sétima arte, a arte que engloba tudo, desde a
fotografia, imagem, voz, música significa que merece respeito. Acho que
precisa-se de muita estima entre nós. Vejo que ainda não há orgulho em comprar
um CD original dos artistas nacionais. Precisamos dar espaço ao que é nosso,
sem descriminação.
No
seu todo, acho que o cinema é uma maneira de ensinar rapidamente. Nota-se que
em três dias que se lê um livro, em cinema pode-se aprender em um único dia. É
o meio de comunicação e ensino muito rápido.
FF:
Com que género cinematográfico mais se
identifica?
LM:
Eu amo fazer documentário, porque é aí onde está o meu desafio de colocar as
imagens reais e dar uma proposta ficcional. O documentário é algo fixo, real e
nele pode-se dar um outro ponto de vista. Não nego fazer vídeo clipes, filmes
sobre ficção, mas o documentário é onde encontro o meu “EU” e o foco do meu
trabalho.
FF:
O que traz de novo no documentário sobre
Chico António a nível dos planos de corte, personagens…? Em forma de sinopse o
que nos pode avançar?
LM:
O maior desafio deste documentário era mostrar como uma coisa passa para outra.
Então, é por isso que quis mostrar como um menino de rua passou para um grande músico.
Alias, queria mesmo mostrar como uma pessoa como Chico que não tem pai, mãe e irmãos
é uma pessoa com família e com uma personalidade respeitada.
Faço
este documentário porque penso que é uma história de coragem que Chico nos
exemplifica e mostra que aqueles meninos de rua não podem terminar somente como
meninos de rua. O que quero dizer é que há sim uma possibilidade daqueles
meninos de rua tornarem-se personalidades e recuperarem sua identidade. Esta é
a principal missão que tive ao realizar este documentário. Este não é um filme
sobre um músico, apesar de falar da vida musical de Chico. Mas o que quero com
o documentário é dar este exemplo de coragem e que a sua história não fosse
somente uma história que ficasse no meu coração ou livro porque alguém leu. O
que queria é que as pessoas se identificassem e reflectissem em todo desta história.
Com
este documentário atingi o meu dever de memória, porque acho que todos têm um
dever de guardar alguma memória em vida.
FF:
A quanto tempo conhece Chico António?
LM:
Conheço Chico logo após João Paulo, isso foi sensivelmente a seis anos e foi
ele mesmo que veio ter comigo, por reconhecer o meu valor e o trabalho que fiz
com João Paulo. Na altura eu só o conhecia em nome, mas foi mesmo em 2009 que
houve uma aproximação e ele sugeriu que eu fizesse arquivos sobre ele.
FF:
Que ambições guarda para um futuro
próximo?
LM:
Na minha profissão gostava de ser um realizador com uma estrutura bem montada
para poder digerir o meu pensamento, o que acontece é que em Moçambique não há
organização e acabo trabalhando, por exemplo, como um homem-orquestra em que
vai fazendo vários papéis dentro do cinema.
Eu
gostaria de fluir meu pensamento e experiencia na escrita e realização, apesar
de amar a edição, mas amo as duas áreas que mencionei. Aminha ambição é também
de promover o nome do país através do meu nome, dos meus filmes ao patamar mais
alto e deixar marcado o nome e o cinema moçambicano.
FF:
Nigéria, por exemplo, é um dos grandes
destaques a nível do cinema africano. Fazendo uma comparação, o que acha que
falta para que o cinema moçambicano concorra com outros tipos de cinemas sejam
eles mundiais ou do continente africano?
LM:
Acho que há falta de cultura nos nossos dirigentes. Se formos a prestar
atenção, vamos perceber que nos temos um a tradição de cinema a muito tempo. Noutros
países os dirigentes tem noção do que é trabalhar com a cultura e no nosso país
os nossos dirigentes são por nomeação política, oque pode dificultar o
trabalho. Um outro problema é que há falta da nova geração de cinema e não sei
quantos cineastas existem com trinta anos para baixo.
Nem
Zimbabwe ou Africa do Sul tem um arquivo de documentários mais extenso ou com
muito material do que nós.
O
documentário “Trompete cometa Guitarra ou
menino de ninguém” tem como parceiros Pro Arte, SPI, Brithol Michcoma, TVM,
Namaacha e conta com 77 minutos em formato HDV e tem legendas em Português,
Inglês, Castelhano.
Na
sua ficha técnica tem Lionel Moulinho no roteiro, câmara e edição, como
assistente de produção conta com Begona Victoriano, Produção de secretariado:
Graça Magaia, Esme Joaquim, Música: Chico António, produção de campo: Zeca
Baila, Tonni, Arranjos e legenda: Chiquinho Martins, caricatura capa: Sérgio
Zimba, foto contra capa: Sol de Carvalho, arte gráfica: Júlia Vilhena,
produção/direcção: Lionel Moulinho, Assistência técnica: António Cabrita e produção:
JP Studio.
Sérgio
dos Céus Nelson