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Em
muitos anos a moral foi um tema que definia comunidades ou povos. Os defensores
incansáveis da moral (que poderei tratar de “moralistas”) sempre procuraram
colocar na mente dos indivíduos a necessidade de preservar as boas maneiras como
forma de criar-se uma sociedade “ideal”, onde reinasse o respeito, não só um
para com o outro, mas também o respeito pelas “normas” sociais.
Falar
hoje em dia de moralistas parece falar da existência de Jesus Cristo que muitos
preferem ver com seus próprios olhos. As escolas moralistas parecem ter sigo
extinguidas e com isso os debates sobre a moralidade se foram reduzindo aos
poucos, trazendo ao mundo um caos que não se consegue controlar se formos a
olhar para os últimos cenários onde a humanidade parece ter perdido o controle
das coisas, do respeito, da honestidade, da ética e da dignidade.
Sendo
a moral um conjunto de regras e prescrições a
respeito do comportamento, de conduta consideradas como válidas dentro de uma
sociedade, comunidade ou grupo de indivíduos, ela ao mesmo tempo serve como
instrumento para mensurar o estado de consciência dos indivíduos. Tal “estado
de consciência” seria perceber se os indivíduos percebem como agem, porque
assim agem ou ainda, se percebem a gravidade dos actos que cometem.
Ainda que a moral não seja uma lei que deve ser cumprida, aliás,
até a própria lei não foi feita para ser cumprida, porém, quem não a cumprir
pode ser sancionado (contradição da lei).
Ou melhor, há na moral implicitamente regras que quando não cumpridas elas
definem os indivíduos (bons ou maus?).
Se por exemplo formos analisar os últimos cenários das
carnificinas dos óleos e gasolinas derramadas sobre os corpos de Homens,
poderíamos perceber que há, provavelmente, uma necessidade, não só de se
discutir a sanidade mental dos criminosos, mas também debater a moralidade nas
sociedades actuais para reconfigurar e restaurar a
estabilidade ideal nas sociedades. Mas falo da estabilidade no sentido relacionamento
Homens para Homens, porque este é o que nos vai garantir se tais relações são
frutíferas ou delas surgem rivalidades.
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Perguntar sobre os moralistas na actualidade me parece crucial, se
formos a perceber que os temas sobre política passaram a definir o rumo
mundial, aliás, sempre definiram. Mas mesmo quando a política surge, a moral
existia até para definir aqueles que na altura chamaríamos de líderes e hoje
chefes. Neste caso, acredito que o mundo está numa fase de se despir, uma fase
de nudez relativamente aos valores, a prevalência de um bom caracter nos
indivíduos, a verdade, até, muitas das vezes, o respeito entre os Homens.
Estamos num cenário em que os pensamentos, de que “cada um deve
lutar pela sua vida” ou que “não adianta agradar a todos porque é impossível”,
fazem dos indivíduos ignorantes, não por natureza, mas por aceitação e decisão,
criando na sociedade o que eu chamaria de alienação dos valores morais entre
relações humanas.
Eram considerados morais, num passado recente, os Homens que
respeitavam os mais velhos, que sabiam ceder espaço aos que em condições
deficitárias se encontrassem, aqueles que sabiam ser na sociedade, tal saber
ser que inclui a postura, a forma como se apresentavam, etc.
Olhando para estas (algumas) características daqueles que seriam
moralmente aceites, podemos indagar o tipo de moralidade que precisamos no
século 21, ou se a moral sempre exaltada tem espaço e aceitação nos tempos
actuais. Ora vejamos, estamos em cenários de autentica roptura com a coisas
básicas que definiam os indivíduos.
Por um lado, temos o respeito que passou a ser uma utopia e um
desconhecimento para muitos indivíduos que lhes falta “serenidade” suficiente
para, de boa forma dirigir-se a um mais velho, mostrando que as boas maneiras
não foram esquecidas.
Estamos num mundo em que, se formos a pensar pornograficamente, o
sexo (prática sexual) reconfigurou-se
como sendo um acto entre parentes e filhos (através de estupros ou de
forma aceitada), a nudez foi levada até aos padres nas capelas e estes rompem
com as devoções, promessas feitas durante a sua consagração (atrasada dizem os
Homens sobre a igreja católica que não quer autorizar o casamento dos padres,
talvez por isso irmãs ficam gravidas e padres acumulam filhos, sem falar dos
papas, cardeais que fazem coitos com criancinhas – só visitando a pesquisa do “The
Boston Globe” para estar um pouco a par do assunto que trouxe à tona numerosos
membros da igreja que abusavam de crianças), o que leva A. DE ST. EXUPÉRY a
dizer que “Hoje o cristianismo se tornou um elemento conservador”, mas tal
conservadorismo põe em causa os próprios valores morais do cristianismo.
Não
discutir a moral significa que preferimos a galinha do ovo, sem saber que do
ovo a galinha nasce, ou é escolhermos o ovo em detrimento da galinha, sem saber
que da galinha o ovo é tirado. Ou seja, os problemas que se tem debatido na
actualidade parecem, de algum modo, uma continuidade de uma cegueira mundana
que não percebe que sem incluir os aspectos morais em suas decisões e
ensinamentos, os Homens continuaram a ser o que o mundo ou vivencias lhes
ensinaram a ser.
Escrevo
este pensamento lembrando-me da ideia de que a moral não é totalitária. Ou
seja, o considerado moral num local pode não ser aceite numa outra região.
Porém, tal facto não ridiculariza o pensamento de que a moral aceite em
determinados locais, comunidades, precisa ser ressuscitada e colocada na mesa
de debate para que se possa perspectivar o rumo das sociedades.
Uma
sociedade moralmente destruída é uma sociedade jogada no abismo, colhendo de
suas insanidades e resultados de suas próprias criações. Neste sentido,
problematizar a existência (actualmente) dos defensores da moralidade,
significa questionar se percebemos que o mundo já redefiniu a moral, ou ainda,
se percebemos que a moral cívica aprendida nas escolas precisa ser levada a
sério para formar-se indivíduos que moralmente e de forma ética se definem na
sociedade.
Acredito,
na verdade, que o vício pela política vai aos poucos quebrando com a moralidade
e vai tornando os indivíduos Homens de elevada fidúcia que os faz crer que o
mundo é tão cego para não perceber que é manipulado e engarrafado em cada
promulgação das leis.
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A moral já não é debatida de forma
exaustiva. Ela não é tida como um tema da atualidade e assim se vai rompendo
com a construção de um Homem “correcto” que respeite as normas que regulam a
sua vivencia na sociedade.
Quando
falo do respeito, falo também do respeito pelas diferentes escolhas na
orientação sexual. Não vou dizer “minorias” porque a comunidade LGBT como
sabemos é de tal forma tão grande que não pode, na minha perspectiva, ser
tratada de minoria. É preciso que seja rompido o termo “minorias” porque isso
faz da comunidade LGBT uma comunidade amedrontada, menosprezada, indefesa. As
pessoas são livres para tomarem decisões, vivemos em países livres constitucionalmente,
e ela a (constituição) já defende todos indivíduos, assim como a Declaração
Universal dos Direitos Humanos preconiza.
Será
que podemos dizer que estudamos, nos manuais, uma moral atrasada/ultrapassada
que precisa ser redefinida? Ficamos tão cegos que a própria cultura, tradição,
dos nossos povos ridiculariza e distorce a essência de uma moral.
A
moral é em si uma contradição. Ora vejamos: seria imoral dar pena de morte ou
seria moral deixar livre o indivíduo que mata, estupra, esfaqueia e arquiteta
mortes em grande escala? Então, podemos dizer que a moral não é objectiva, há nela
uma subjectividade que, por vezes, a torna ilusória.
Seria,
neste caso, a moral um tema para distração das sociedades ou uma utopia que
serve para ditar regras? Se em Deus os crentes encontram a totalidade da moral,
onde os ateus buscarão tal conhecimento?
Paul
Eugene Charbonneau In “Moral Conjugal do século 20”, quando retrata sobre a
teologia moral, a moralidade do cristianismo, faz-nos perceber que um problema
moral é um problema de razão e agir e ser, e que provavelmente a actualidade
esteja distraída numa moral da ambiguidade, aliado ao pensamento de Sartre ao
afirmar que “estou plenamente convencido que toda moral é ao mesmo tempo
impossível e necessária”.
Debater
a ética e moral (ética está associada ao estudo fundamentado dos valores morais que
orientam o comportamento humano em sociedade, enquanto a moral são
os costumes, regras, tabus e convenções estabelecidas por cada sociedade) impõe-nos
o desafio de problematizar as ações humanas, o civismo, a conduta, costumes,
como o caminho que nos levará, provavelmente, a um esclarecimento sobre a pertinência
do debate sobre os mesmos.
Enquanto os Niilistas morais sustentam que
qualquer conversa de uma moralidade objetiva é incoerente, o físico
Sean Carroll acredita que conceber a moralidade como uma ciência poderia
ser um caso de imperialismo científico e insiste em que o que é "bom para
criaturas conscientes" não é uma definição de trabalho adequada de
"moral", tais pensamentos que reforçam, de algum modo, a perspectiva de
Charbonneau quando declara que “a moral se transforma então numa espécie
de contabilidade um tanto duvidosa do bem e do mal, do mérito e demérito”,
sustentando seu pensamento na ideia segundo a qual “o dogma e a mal estão de
tal forma congelados que mais parecem petrificados ou mortos”.
Se
para Para Kant, a moralidade seria o ir além da
natureza e o homem, capaz de ir além da ordem natural, seria capaz de se autolegislar,
sendo a autonomia o foco da moralidade, então, podemos crer que a moral não é
imutável, ou ainda, podemos recorrer a George Luckacs quando diz que a
liberdade seria, pois, negar a existência de uma moral objectiva.
Um dia, Dostoievski dissera que: “pude perceber
perfeitamente, pela primeira vez em minha vida, que eu não compreendia nem
sentia o bem e o mal, que não somente eu havia perdido a noção deles que o bem
e o mal, em si, mas existiam (o que era bastante agradável para mim), que eram
apenas preconceitos, que eu poderia certamente libertar-me de todos os
preconceitos, mas que, se eu conseguisse essa liberdade, estaria perdido”.
Esta
aparente contradição no pensamento de Dostoievski faz-nos repensar em Jacques
Leclerco que acredita na ideia de que “ a ciência moral consiste, de um lado,
em determinar os princípios e, de outro lado, em determinar as regras que
permitirão a aplicação desses princípios aos casos particulares. A arte moral é
de fazer essa aplicação”. Mas perceber Leclero é ao mesmo tempo voltar a frisar
a ideia de uma moral ilusória que se desconhece no seio das sociedades, mas
também é invocada quando a atitude humana se sobrepõe aos preceitos que o mundo
os considera de corretos.
Sérgio dos Céus Nelson
Podemos
debater a moral no século 21?